19.8.10

segundo mês: vigésimo quarto dia

este post vai para este outro.
porque nunca é demais enaltecer as maravilhosas qualidades dos que, como eu, escrevem com a mão esquerda.

ah pois!

canhotos,
esquerdinos,
como é que consegues escrever assim?
ah!
ha ha!

sabes que os canhotos são mais inteligentes que os destros?
ouvi dizer que os canhotos vivem menos oito anos que os destros.

ai sim?

sim, porque como são mais inteligentes, esgotam os cartuchos mais depressa.
isto suponho eu, porque dentro de tamanha parvoice, tudo é possível e aparvalho também eu.

mas que me sinto especial, lá isso sinto.

-
e agora revelo a verdadeira razão deste post, bem mais original e até perturbante do que possa ter parecido até agora. (embora nunca seja demais enaltecer as maravilhosas qualidades dos canhotos, não sei se já referi).

ora bem, o que se passa é que ao chegar a nova iorque, e à sagmeiste inc. , resolvi substituir o rato que uso na mão direita desde que me lembro de estar sentada à frente de um computador a desenhar no paint, por uma tablet, que para quem não sabe é uma caneta que substitui o rato.

demorei umas duas semanas a habituar-me. passar a controlar o cursor com a mão esquerda não foi assim tão simples. que eu sou canhota de corpo todo, de alma toda (e cérebro, suponho) mas foram muitos anos! e se sabe bem e faz sentido usar a mão esquerda para clicar, arrastar, desenhar no photoshop, o mesmo não posso dizer da mão direita que, assim de um momento para o outro deixou de ter o privilégio de comandar o rato e passou a estar encarregue do teclado. escrever escrevo com as duas, mas se estou no illustrator, todos os comandos, combinações complexas de duas ou mais teclas, são agora responsabilidade da mão número dois. desculpa aí pá, não leves a mal, mas a esquerda... é a esquerda!

lá me habituei.
tirei o rato da secretária e selei assim o momento.

uma noite, quis trabalhar em casa num ficheiro no qual tinha estado a trabalhar no estúdio. tenho um macbook, e para o uso que lhe dou, o rato é quase desnecessário, servindo o trackpad. mas para trabalhar no illustrator, lá tive de ir buscar o rato à gaveta.

foi então que aconteceu.
o meu cérebro entrou em parafuso, confuso, entalado, enrolado, emaranhado, assolapado, surpreendido, bloquea-a-a-a-a-a-a-a-a-ado.
porque de repente não sabia que mão usar.
caneta na mão esquerda faz algum sentido porque tem uma forma e manuseabilidade ao qual estou habituada (ainda mais agora que passo o tempo todo a desenhar)
mas rato na mão esquerda?? onde é que isso faz sentido na minha cabeça?
aonde?

desconfortável.
comichão mental.
como não ter posição à noite para dormir (mal de que felizmente nunca padeci, eu que durmo que nem uma pedra em qualquer cantinho, e até sonho no metro).
viras-te para um lado, viras-te para o outro, levantas-te, vais fazer chichi, voltas, o mesmo. vais beber água, voltas, o mesmo. que horror.
alternei de uma mão para a outra, experimentei o trackpad, mas era difícil para fazer selecções e ao mesmo tempo executar shortcuts complicadas, uma espécie de origami com os dedos, todos encavalitados.

ou melhor, um jogo do twist, aquele que é assim meio pornográfico quando se pensa bem nisso. ainda que nos filmes apareça sempre como algo super inocente, como se até eles se espalharem um em cima do outro não tivessem pensado nisso. bah, odeio filmes de balde de gelado (ai ai o que me apetecia um santini agora)

pois bem, solução? comprar uma tablet para usar em casa, dizer adeus aos ratos.
e é engraçado que tenha acontecido aqui, porque nova iorque está impestada deles. todas as noites são famílias inteiras de ratazanas a passear pela rua de mão dada, sem qualquer consideração pelas pessoas que estão a seguir o seu caminho descansadas da vida. uma vergonha.

nada mais tenho a acrescentar por hoje.

e sim, voltei ao meu ritmo de antes, a sair do trabalho antes das 9 da noite! yupiiii!

18.8.10

segundo mês: vigésimo terceiro dia (dois)


muito trabalho. muito trabalho novo, diferente, assustador na sua dimensão. números grandes que não me dizem nada condicionam o acto de criar. mudas uma linha, e são mais 500$ para o fotógrafo, 500 para o retocador, 500 para o tipo cuja profissão é fazer tudo isto acontecer e ligar as pessoas envolvidas, uma espécie de facebook humano da publicidade.

é que eu não gosto de publicidade por isto mesmo. pelo tamanho que obriga a uma divisão e racionalização do processo, assim à laia de fábrica. como é que alguém consegue ter prazer em executar apenas uma pequena paqueníssima tarefa dentro do todo? eu cá não tenho, isso garanto eu.

o bom do estúdio onde trabalho é que somos só 6. a fazer projectos de grande escala, com grandes números, com uma abrangência inacreditavel. um luxo.

as últimas semanas têm sido uma canseira, fisicamente em especial, porque agora que estou a morar com 3 pessoas e agora que estou num prédio onde todas as noites alguma coisa se passa, festas, matraquilhos no terraço, barbeque, jantares animados, divido o meu tempo entre trabalho e casa, e as duas parcelas lutam pelo tempo, lutam pelo meu tempo e roubam o tempo ao sono.


a minha casa tem duas caras. e enquanto escrevo isto, entram em casa o michael e o graham, de bicicletas em punho, mochilas cheias de legumes que trouxeram do trader joe's dumpster diving, que é quando o supermercado deita fora quilos e quilos de comida boa ao fim do dia.

às vezes a minha casa tem muita gente.

segundo mês: vigésimo terceiro dia (um)




cheguei,
estou, 
sou isto, sou aqui.
casa,
casa,
casa!

sinto-me mesmo em casa.
adoro a minha casa, casa vida que todos os dias fica mais bonita. compro lápis de cor, um girassol, cozinho para todos com efervescência num wok que parecia estar à minha espera. como eu adoro cozinhar numa casa que tem tudo o que preciso. uma cozinha quente, onde já fiz biscoitos, crepes, tortilhas amassadas à mão, onde dancei e onde tomei o pequeno almoço, onde cantei e assobiei porque estou mesmo bem e até me distraio. nesta casa, dois dias depois de chegar, adormeci de porta aberta, atirada para cima da cama, com o meu caderno de desenhos por cima da barriga, a música alta, o roommate a lavar o chão qual fada do lar. adormeci e dormi como não dormia há muito tempo, numa segurança que vem de dentro.

-

uma das coisas que eu mais gosto nesta casa, é a paleta de cores. é uma casa que mesmo vazia é quente e acolhedora, viva! o meu quarto tem paredes pintadas por antigos ocupantes, uma amarela e duas azuis. o chão preto, industrial. a quarta parede forrada a janelas por onde a luz jorra de manhã.

plantas. todas têm nomes, embora ainda não tenha decorado todos. sei que uma delas se chama bambi, outra vera (aloe vera, essa é fácil). acrescentei à família duas sementes de abacate que estou a germinar. não tinha plantas desde a primária, acho eu, e está a ser uma excitação. ainda não têm nomes, mas todos os dias lá vou eu ver se a raiz já está a despontar, e falo com elas, encorajo-as.

a minha casa tem muitos livros, que por acaso estão debaixo das muitas plantas. grande parte deles pertenceram outrora a antigos ocupantes que por alguma razão não os puderam levar com eles. os meus já lá estão. poucos, porque continuo a ler livros da biblioteca. embora agora não tenha tido tempo nenhum para ler.

aqui estão bocadinhos da minha casa.

projecções para ver filmes na sala
colunas espalhadas pela casa para ouvir música ou ver filmes
sofás grandes para quem queira cá dormir
a peruca que encontrei no primeiro dia no corredor, adoptada e posta no manequim por cima do frigorífico.
pessoas a entrar e a saír, infinitas combinações de toalhas, o meu bocadinho preferido da minha casa. (a minha é amarela banana)

5.8.10

segundo mês: décimo primeiro dia


olá, chamo-me maria nogueira. já nos conhecemos antes? blog? escrever? em ti? todos os dias? como assim? deve-me ter passado ao lado, devo-me ter esquecido no meio do vendaval que me virou do avesso.

adoro a minha casa nova! mudei-me no domingo e desde então:
- joguei matraquilhos no terraço e descobri que até jogo bem e até marco uns golaços
- fiz granola no forno
- fiz fajitas mexicanas para 10 pessoas, estiquei a massa com o rolo e dancei com farinha nos jeans
- comprei uma caixa de tampões para os ouvidos e de manhã não ouvi o despertador
- encontrei uma peruca no corredor e na manhã seguinte dei de caras com ela na mesa de jantar.

que mudança astronómica em relação à antiga casa! estou tão feliz! adoro as pessoas com quem vivo e todos os dias conto as horas que faltam para sair do trabalho e poder voltar para este meu cantinho.

estou cheia de trabalho, a construir um mundo de papel para uma marca de roupa de crianças. e feliz da vida porque me permite tirar os dedos das teclas e usa-los para colar coisas pequeninas e que requerem concentração. descobri que me relaxa e que afinal tenho algum jeito para fazer coisas assim. detestava fazer maquetes em design de ambientes, mas estou a ter um gozo enorme nisto.


fui ver sonic youth à borla no parque, a minha despedida de prospect heights e da minha bicicleta, estacionada no parque gratuito de bicicletas durante o concerto. foi bom!


agora, em correria, vou para o trabalho, de volta às maquetes, último dia antes de serem fotografadas. pressa, pressa, ansiedade e rapidez máscara de sono, o qual ataca sem avisar lá para depois do almoço. sem tempo para desenterrar a imensidão de coisas que tenho dentro de mim (e boas que são!) e talvez porque elas mesmas estão ainda em desenvolvimento, a tinta a secar, a poeira a pousar, não queria no entanto deixar de dar aqui um saltinho, uma amostra de queijo no corredor do supermercado.


estou bem, estou optima! domingo barbecue no terraço!