10.7.10

primeiro mês: décimo quarto dia (parte dois)

pausa para lanche, e cá estou de volta com um assunto extremamente fútil para dissecar. um assunto cheio de corrector de olheiras, de blush, de rimmel, de saltos de 20 centímetros o que em inches não faço ideia o que será.

no meu primeiro dia de trabalho, um mês e dez dias atrás, lá fui eu toda fresca e fofa para o metro, feliz da vida. nessa altura estava numa casa provisória que era um bocado mais longe de manhattan, e o metro estava quase vazio. e o quase que foi ficou-me gravado na parte de trás da cabeça onde ficam gravadas coisas e nós nem sabemos bem porquê. uma das pessoas era um rapaz. e eu achei mesmo estranho que ele estivesse a tomar o pequeno almoço em pleno metro. tinha um saquinho de papel craft numa mão, de onde tirou uma salada de grão que foi comendo enquanto segurava entre os pés um copo de café daqueles do starbucks. achei estranho! pensar nisso agora até me dá vontade de rir. porque estranho para mim agora é uma coisa bastante diferente, se é que alguma coisa o é. vi um homem com a cabeça toda tatuada a usar calções cor-de-rosa e vi um cowboy em cuecas a tocar viola. estranho é marte!

mas nessa altura eu tinha acabado de chegar e ainda não tinha visto nada disso. e como tal, a segunda pessoa que captou a minha atenção ainda me pareceu mais estranha. na outra ponta do comboio, uma rapariga que devia ter a minha idade mas que estava com uma roupa meio profissional, maquilho-se durante todo o percurso. camada em cima de camada, abanão a seguir a solavanco, muito cuidadosamente foi passo a passo pondo tudo e mais alguma coisa num ritual altamente complexo e completo! ia tirando batons e pincéis de um necessair que mal cabia na mala e tudo isto feito com uma total indiferença pela minha pessoa ou o meu olhar embasbacado (embora tentando disfarçar).

tudo muito estranho.

o que me traz ao assunto de hoje! assim como um programa de culinária tem as suas receitas, também eu hoje tenho um tema, resultado de um mês e catorze dias de observação e sedimentação de conhecimentos.

A Mulher Nova-Iorquina e suas descendentes
1. maquilha-se no metro enquanto vê os emails no iphone
2. chega ao trabalho de ice coffe na mão, o seu pequeno almoço
3. usa sapatos que fariam cair qualquer modelo na passerelle e usa-os com destreza, desviando-se de buracos no chão, poças, tampas de esgoto e taxistas enfurecidos...
4. ... que chama esticando o braço (ainda não vi nenhuma assobiar). braço esticado, queijo erguido, orgulhosa, qual estátua da liberdade, sem medo de nada.
5. apesar de andar sempre ultra elegante, quando sai do trabalho e vai para um bar (o que aqui pode acontecer a qualquer dia da semana) parece que vai a um casamento. os sapatos ainda mais altos maiores do que a mala que apenas contém o estritamente-mente-mente necessário.
6. a nova-iorquina não bebe vinho, bebe cocktails e aguenta-os bem. Ao sair do bar por volta da meia noite (a noite começa incrivelmente cedo) vai de braço dado com a amiga, quase não se bamboleando nas suas andas, quase não se queixando de dores nos pés! incrível. na verdade tem um segredo: uma gama completa de almofadas de gel de todos os tamanhos e feitios, para proteger todo e qualquer bocadinho de pé. se isso não funcionar, existem também sabrinas que se enrolam e cabem num saquinho que pode trocar pelos sapatos assassinos ao voltar para casa.
7. domingo é dia de brunch com as amigas, brunch regado a margaritas e blodymarys claro está!
8. quando não há festas e não fica até tarde a trabalhar em casa (o computador que tem é melhor que o do trabalho) vai para o ginásio para continuar em forma. sempre elegante, sempre maquilhada, tem o rímel a escorrer pela cara quando sai do banho turco.
9. com este calor que tem estado, a mulher nova-iorquina almoça um batido de frutas no jamba juice, que encomenda à estagiária (eu) - mega mango com boost antioxidante, ou energy, ou wheat grass. shots de saúde que contrapõem os trezentos cafés que toma por dia.
10. A mulher nova-iorquina gasta 300$ numa mala que parece da zara. E acha que a minha mala de 12€ deve ter custado uma fortuna! YEY!!


alguns destes itens resultaram de uma pura observação, outros foram baseados numa rapariga que trabalha comigo e com quem me tenho fartado de rir. é a única nova-iorquina de gema que conheço, e a única americana que trabalha na Sagmeister Inc. Neste momento somos 6: um austríaco, um alemão, um canadiano, um sueco, uma americana e uma portuguesa!


descalços no trabalho :)

2 comentários:

hpc disse...

Então e os ténis, maria? São só os homens que os usam na rua, com fato e gravata? Julguei que as mulheres os usavam tb com casacos de peles e tudo.
BEIJINHOS

Unknown disse...

por acaso reparei no outro dia que uma senhora com um ar ultra profissional tinha uns tennis brancos todos hi-tech. fiquei na dúvida se teria trocado os saltos do trabalho por eles para voltar para casa. muito muito peculiar :)

estou agora a ler a queda de Albert Camus! comecei hoje de manhã no metro!